Teologias que não escutam

Teologias que não escutam

Photo by Cristina Gottardi on Unsplash


Todo relacionamento precisa de escuta atenta. Não raro ouvimos que alguma relação tenha terminado entre duas pessoas porque uma não ouvia a outra, ou porque uma parte não se atentava àquilo que a outra demandava, tendo com a sensação de se falar com as paredes. De tanto insistir em ser ouvida e não haver nenhum tipo de resposta se considera o rompimento como a única coisa a se fazer e, uma vez acabada a esperança, encerram-se também as possibilidades de retorno.

Quando olhamos para a questão da teologia e sua relação com o mundo, a premissa com a qual começamos nosso artigo também se aplica. Não dificilmente temos presenciado teologias que se distanciam do mundo, não ouvindo o que este tem a dizer em suas diversas vozes. Focando-se somente em doutrinas, normas, teorias etc constantemente a teologia tem se tornado surda para com aqueles e aquelas com quem deveria se relacionar.

No entanto, em um país no qual a maioria das pessoas se diz cristã, é possível também perceber que as pessoas ainda querem ouvir algo por parte de teólogos e teólogas. Algo que faça sentido para suas existências diárias, que traga conforto e respostas para seus dramas.

Diante desse cenário, torna-se importantíssima uma teologia pública, que seja feita a partir de baixo, das experiências do povo, de suas lutas e suas questões. Isso não quer dizer deixar a seriedade de lado. Muito pelo contrário, significa tomar a atitude essencial para um bom relacionamento, que é ouvir o outro com quem se relaciona. Descer de certo pedestal imaginário no qual diversos teólogos se colocam, achando que estão por cima de todo mundo, e abrir mão da pretensão de serem os detentores de uma verdade última, a qual somente eles têm acesso são tarefas imprescindíveis. Não cabe mais uma visão teológica nos moldes de uma cristandade da Idade Média, na qual o cristianismo era quem ditava o certo e o errado. Esse saudosismo por parte de grande parcela religiosa no país somente contribui para o constante afastamento da teologia na relação cristianismo – sociedade.

É imprescindível para o cristianismo compreender que não há escuta sincera se não houver humildade e que não se alcançam pessoas sem a disposição para ouvir com atenção o que elas têm a dizer. Talvez, na contemporaneidade, o ato de ouvir seja um dos maiores desafios para o cristianismo.

Ao mesmo tempo, lidar com tal desafio pode fazer com que a proposta cristã volte ao seu fundamento, que é a pessoa de Jesus de Nazaré, o galileu que andava com os humildes e pobres de seu tempo, expondo o Reino de Deus numa linguagem cotidiana, de fácil assimilação, sem rebuscamentos, mas com profundidade e seriedade. Uma mensagem que, como disseram os caminhantes de Emaús, “ardia o coração” quando se ouvia. 

Recuperar o exemplo de Jesus, refazer seu comprometimento com o povo de caminhar junto com ele, sentir suas dores, ouvir seus clamores e anunciar a esperança do Reino de Deus deveriam ser a principal tarefa teológica da atualidade e todo o resto deveria, portanto, ser considerado como adendo e nota de rodapé para explicitar alguma coisa que seria importante de ser lembrada.

Infelizmente, em várias teologias atuais é o exemplo de Jesus que tem sido tomado por nota de rodapé nas pomposas e bem articuladas elucubrações que vários teólogos e teólogas têm feito em suas tentativas de falar somente a seus pares, deixando de lado aqueles e aquelas para quem Jesus falaria e a quem ouviria, caso vivesse em nossos dias.

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