Disse-me certa vez um senhor idoso

Disse-me certa vez um senhor idoso

Disse-me certa vez um senhor idoso em uma conversa que começou em um ponto de ônibus,
Sabe, houve um tempo em que quis revolucionar o mundo.
Pensei em sanar a fome mundial, resolver os problemas de tráfego de onde morava, salvar os marginalizados que via nas ruas todo dia.
Esse tempo passou. Percebi que não podia mudar o mundo todo e decidi simplesmente alimentar os que vinham à minha porta, dirigir de forma responsável e reclamar ao ver alguma injustiça próxima a mim. Ao fazer isso, notei que o mundo a minha volta tinha tornado revolucionado.
Percebi então, que meu sonho de juventude, havia se realizado na serenidade da alta idade.
Houve um tempo em que quis encontrar um grande amor. Procurei então, alguém que fizesse meu coração bater mais forte, mais acelerado. Alguém em quem não pararia de pensar durante 24 horas e que, da mesma forma, ela pensasse em mim também.
Com o passar dos anos, percebi que isso não era amor. Aprendi que o amor é algo livre e leve e e estava muito mais relacionado com a cumplicidade e com o diálogo do que ao querer e o desejo e entendi que aquele que não nos ama pelo que somos, não nos amará quando mudarmos.
Ao descobrir isso, foi possível encontrar o que tanto procurava: sem batimentos ultra acelerados, sem pulos de cima da ponte; simplesmente uma companheira que procurava também um companheiro. E assim, sereno e calmo como as brisas da manhã, casei-me
Houve um tempo em que quis fazer muitas coisas. Acreditava que a vida passava muito rapidamente e por isso deveria produzir sempre, estar sempre em atividade.
No entanto, com o passar do tempo, percebi duas coisas que trago até hoje comigo: primeiro, que a vida realmente passa rapidamente e que bons momentos devem ser aproveitados como se fossem últimos e em segundo lugar, que produção exacerbada não traz uma vida mais feliz.
Ao perceber isso, comecei a produzir menos prezando pela qualidade daquilo que fazia. Notei com isso que os resultados se tornaram permanentes e que mais pessoas se beneficiaram do pouco que fazia. Percebi que havia feito muito mais com muito menos entendendo que tudo que fazemos deve ser simplesmente reflexo do que somos para que a vida seja coerente.
Por fim, houve um tempo em que decidi encontrar Deus. Passei a procurá-lo nos templos e nas religiões.
Na época, via a Deus como o senhor que sempre ouvia falar. Um Deus que anotava diariamente meus erros e acertos, que me amava ao ser bom e me odiava ao ser mau.
Mas esse tempo passou.
Entendi que o evangelho que Jesus pregava visava reconciliar o homem com Deus porque Deus ama ao  homem. Compreendi que não há nada que poderia fazer para que Ele me amasse mais ou me amasse menos, que Ele me ama pelo que sou e não pelo que deveria ser.
Ao perceber isso, passei a ver Deus nas pequenas coisas. Sem me tornar panteísta, passei a ver Deus na natureza, na brisa das manhãs, nas tempestades, nos dias calmos e no voar das aves.
E assim, encontrei um Deus que é pai, pessoal e se importa com o homem. Entendendo isso, passei a amar as pessoas e me importar com aquelas que vinham até mim reconhecendo que para reconciliação, é necessário aproximação. E assim, encontrei o Deus que tanto buscava.
Hoje, na minha atual idade, me alegro com a vida que tive e com a vida que ainda vivo.

Pense nisso, meu filho. Agora tenho que ir. Meu ônibus chegou.

Fabrício Veliq
07.01.2011 – 20:04

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *